Diário
terça-feira 15 de dezembro, 2020
A importância do altar
À visão da mente racional, superficial e extremamente prática, um altar não tem qualquer significado e função. É puramente um desperdício de tempo, energia e dedicação. Mas na visão tântrica e nas tradições ancestrais vive nele um significado espiritual profundo e vasto.
Só quem vive essa experiencia reconhece com o coração o que realmente significa e os seus benefícios...
Se ao contemplar apenas vir um conjunto de objetos com valor puramente material ou estético, esse altar aparece vazio aos meus olhos e não enche o coração.
Mas, se ao contrário, independentemente do valor material ou do meu conceito de estética, sentir devoção, sacralidade, sabedoria, beleza, então estou perante um lugar de poder. Assim deve esse espaço ao qual lhe damos o nome de altar.


O que é para mim um altar?
É um espaço onde se condensa a energia da nossa prática. A devoção, a oração, os mudras, as afirmações, os mantras e as oferendas materializam-se no altar. É a nossa espiritualidade enraizada. É beleza encarnada!
É o nosso jardim espiritual. O jardim que cuidamos, nutrimos, alimentamos para que este também nos possa cuidar, nutrir e alimentar. Ao fazê-lo não só criamos um espaço com ordem, pureza e sacralidade, mas também esse espaço influencia o nosso estado individual energético, emocional e mental.
É um solo fértil onde semeamos as nossas intenções. Onde colhemos os frutos do que lá cultivamos. Onde permitimos morrer o que já terminou para celebrarmos o que de novo nasce.

Criarmos e cuidarmos do nosso altar cria um espaço para empoderamento energético e espiritual.
Pode ser um altar muito simples que passa despercebido aos olhos não apurados.
Até pode estar escondido para que ninguém se aperceba dele.
Também pode ser um altar mais elaborado ou sofisticado.
Mas em conclusão o valor material não tem qualquer importância comparado com o significado, cuidado e devoção que lhe colocamos.

A principal função do nosso altar é de enraizar a energia da nossa prática formal.
A prática formal pode ser tão simples quanto entoar um mantra ou uma canção medicina, uma pequena oração ou afirmação, alguns mudras ou respirações conscientes, uma breve dança ou movimento corporal ou uma curta meditação ou contemplação... ou então mais elaborada como uma sadhada ou sessão mais completa integrando várias práticas de corpo-palavra-coração ou mesmo uma fusão de técnicas de diferentes tradições.
E naqueles dias em que não há tempo, motivação, ânimo ou vitalidade simplesmente repousamos ou prosternamos à frente do nosso altar num ato de rendição total. Esse momento nesse espaço-vivo empoderado inspira-nos a regressar ao estado de mente, coração e corpo desperto.

Um altar representa o nosso refúgio, a gruta ou a caverna do nosso ser mais profundo.
O lugar onde nutrimos o nosso espírito. Damos comida à nossa essência.
Esse lugar onde todos os dias vamos lá cuidar, cultivar, colher... o nosso jardim espiritual.


Mas Ana, o altar pode ser o jardim da nossa casa ou um lugar na natureza?
Claro que sim... mas a esse lugar deves regressar todos os dias. Esse é o teu compromisso. Lá deves ancorar a tua energia, as tuas sementes, o teu amor.


E quando viajar ou me ausentar?
Leva contigo uma pequena representação do teu altar!
Um cristal, o japa-mala, uma flor.......


E quando mudar de casa, cidade, país?
Recomeças um novo altar numa nova relação com o novo lugar onde vives, com a energia da nova casa, da nova terra, do novo país...


Podemos ter muitos diferentes tipos de altar, em diferentes cantos da casa ou do planeta... mas há um que mais nos chama numa determinada fase da nossa vida, e a esse devemos levar a nossa presença, amor e respeito a cada dia.


Como construir um altar?
Com três palavras apenas podes criar o teu próprio altar: Simplicidade, Beleza e Significado de acordo com o teu sentir.
Também sinto ser fundamental criar um espaço para Oferendas e a representação dos Elementos ou Natureza.
E é vital impregnares o teu altar com as tuas intenções, princípios e valores.

Como a minha prática formal principal é a sadhana da Tara Verde é importante para mim seguir certos preceitos da tradição Tantrayana ou Vajrayana que a mim me fazem todo o sentido.



Como elaborar e cuidar dum altar Vajrayana?

No centro colocas algo (imagem, estátua, thangka, pintura, desenho, etc) que representa o estado desperto – o que chamamos de Buda – que pode ser na forma feminina ou masculina. Esta imagem deverá funcionar como espelho de ti!
Ao lado esquerdo coloca-se textos sagrados a representar a palavra desperta... ao lado direito cristais a representar a stupa ou mente desperta. Bom, eu tenho cristais por todo o meu altar! :)
À frente da imagem que representa Buda colocas as oferendas em taças dispostas em fila. No entanto eu prefiro dispor em circulo-mandala essas taças-oferendas.

As oferendas externas são simbólicas e representam a manifestação das oferendas internas. Estas oferendas ajudam-nos a enraizar as nossas oferendas internas.

Normalmente as oferendas têm esta ordem da esquerda para a direita (em sânscrito):
Argham – água de beber
Paddyam – água de lavar
Pushpe – flores frescas ou secas
Dhupe – incenso
Aloke – fogo, luz, chama
Ghande – essência ou água perfumada
Naividya – comida (na forma de frutos secos, biscoitos, chocolates...)
Shabda – música (opcional, representado por um búzio, um pequeno instrumento musical, címbalos, taça tibetana, etc)

Na Índia ancestral estas eram as oferendas que os anfitriões faziam a um convidado.
Estas oferendas fazemos às deidades que nos inspiram e que representam o sagrado, o divino, o estado desperto que é nossa verdadeira natureza.

Também existem as oferendas secretas:
Men – simboliza o principio masculino
Rakta – simboliza o principio feminino

Por último, existe o Serkyem como oferenda aos Protetores / Guardiães, também chamados Dharmapalas.

Todos os dias deverás renovar as águas, acender a vela e queimar o incenso de forma ritualística, com toda a tua presença e amorosidade.
A água velha deverás oferecer à Mãe Terra, no teu jardim ou nas plantas da tua casa.
E todos os meses num dia especial deverás renovar as restantes oferendas, entregando, se possível, os restos também à Mãe Terra. Normalmente nesse dia também se pratica o Tsog (celebração tântrica).

Deverá ser um altar vivo, o teu jardim espiritual que cuidas diariamente com amor e respeito. Num dado momento não existe separação entre ti e o teu altar. O que vês fora é uma extensão do teu interior.

O meu altar também inclui elementos de outras tradições que honro, como a tradição Maya e Muisca. E gosto muito de lá colocar os meus trabalhos de arte-espiritual mais atuais como por exemplo certos desenhos e oráculos com o sangue menstrual.


O altar é um tema muito belo, vasto e profundo que, na minha visão, urge resgatar das tradições mais ancestrais ainda que adaptando às nossas crenças, necessidades e tempos. Mas a essência deverá preservar-se com carinho como se duma pérola preciosa se tratasse.


Se gostarias de aprofundar mais e aprender a elaborar de forma mais ritualística o teu altar, aguarda pelo próximo retiro/transmissão de Tara Verde, onde irei aprofundar mais os temas do altar tântrico e do Tsog (celebrações tântricas) que nas edições anteriores não o fiz.


Possamos voltar à sabedoria do simples, à beleza do ritual e a resgatar o verdadeiro significado do que nos faz bem, empodera e desperta.

Om Tare Tuttare Ture Soha





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